Você é pai, mãe, tio, tia, avô ou avó? Ou tem em sua convivência uma criança? Então, provavelmente já ouviu ou presenciou casos de responsáveis preocupados com o desenvolvimento da linguagem ou com o atraso na fala dos pequenos.

O tema é bastante complexo e exige um olhar especializado para que as pessoas que convivem com a criança possam se basear em informações de qualidade. Por isso, a Solutudo Bauru conversou com Simone Lopes-Herrera, fonoaudióloga formada no campus de Bauru da Universidade de São Paulo (USP), especialista em Linguagem, mestre e doutora em Educação e Ciências Humanas, livre docente em Linguagem Infantil e Fluência e professora do Departamento de Fonoaudiologia da USP em Bauru.

Atraso na fala de crianças: fonoaudióloga de Bauru explica quais são os sinais de alerta e quando procurar ajuda especializada
Simone Lopes-Herrera (Foto: Divulgação)

Cada criança tem seu tempo?

A ideia de que “cada criança tem seu tempo” é bastante repetida. No entanto, Simone pondera que, embora o ritmo de cada um deva ser respeitado, existem marcos de desenvolvimento que são esperados e, desde antes da fala surgir, existem comportamentos considerados pré-linguísticos que mostram a intenção de comunicação.

De acordo com a fonoaudióloga, o nosso desenvolvimento de linguagem se dá pela relação de fatores orgânicos (que são naturais ou inerentes) e ambientais (isto é, que dependem do ambiente em que o ser está inserido). “Então, nós temos o que é esperado para a nossa espécie com relação à comunicação, como os olhares, o contato visual e manifestações de reconhecimento no que diz respeito a outras pessoas. Tudo isso, antes da fala em si emergir, é a evolução comunicativa, desde antes dos atos serem propositais até se tornarem”, pontua.

Logo, Simone afirma que a expectativa é que o bebê, por volta dos cinco ou seis meses, já esteja balbuciando e fazendo sons – e tem uma ordem: começa-se com sons vocálicos; passa para um padrão de consoante e vogal; depois, consoante, vogal consoantes e encadeamento de sílabas.

“A criança começa a apontar, a mostrar seus desejos com intenção de comunicação e a ter atitudes comunicativas, como a de fazer ‘graça’ para chamar atenção para si, até que a fala acontece por volta do primeiro ano de vida. Projeta-se que as primeiras palavras sejam as de uso comum, que têm sons fáceis de produzir, o que chamamos de bilabiais (‘pã’, ‘bã’, ‘mã’, então o P, o B ou o M). São termos mais simples e frequentemente usados (como em ‘papai’, ‘mamãe’ ou ‘papa’ de comida)”, avalia a professora.

Atraso na fala

A especialista informa que existe uma tríade a ser levada em conta: a fala, a linguagem e a comunicação. Assim, a comunicação é todo ato, verbal ou não, que transmite uma mensagem. Já a linguagem tem relação com aquilo que a gente vai aprendendo a significa (Simone exemplifica com a palavra “carro”, que pode ter uma carga de significado diferente para cada pessoa).

A fala, por usa vez, acontece quando alguém externa tudo isso por meio de símbolos verbais. “A fala em si é um marco aguardado. Então, o aparecimento das primeiras palavras é esperado por volta do primeiro ano de idade. É claro que isso é uma média indicada por estudos, e há crianças que começam um pouco antes ou um pouco depois. Mas a gente nunca pode esperar muito mais do que três ou seis meses. Até esse ponto é considerado um atraso. Se não, a gente já entra na esfera dos distúrbios quando passa desse tempo”, declara a fonoaudióloga.

“A fala em si é um marco aguardado. Então, o aparecimento das primeiras palavras é esperado por volta do primeiro ano de idade. É claro que isso é uma média indicada por estudos, e há crianças que começam um pouco antes ou que começam um pouco depois. Mas a gente nunca pode esperar muito mais do que três ou seis meses. Até esse ponto é considerado um atraso. Se não, a gente já entra na esfera dos distúrbios quando passa desse tempo”

Simone Lopes-Herrera, fonoaudióloga formada no campus de Bauru da Universidade de São Paulo (USP), especialista em Linguagem, mestre e doutora em Educação e Ciências Humanas, livre docente em Linguagem Infantil e Fluência e professora do Departamento de Fonoaudiologia da USP em Bauru.

Simone também considera relevante ressaltar que a fala não pode ser a única coisa a ser levada em conta, tendo em vista que é necessário avaliar diversos fatores, como se a criança está reagindo, como está se fazendo entender ou se compreende o que os outros falam. “Também é importante entender se o pequeno tem estímulos suficientes porque ele não vai falar se as pessoas não falarem com ele, não interagirem e não brincarem. Deve-se observar se a criança tem períodos de convivência com outras crianças e com adultos que dialogam com ela e a tratam como interlocutora”, acrescenta.

Intervenção: quanto antes, melhor

Simone Lopes-Herrera reforça que é complicado colocar padrões para o desenvolvimento infantil, mas parâmetros precisam existir. Nesse sentido, a fonoaudióloga recomenda que é sempre muito importante, quando surgir uma dúvida, consultar um profissional habilitado para fazer uma avaliação da fala, da linguagem e da comunicação. E a prioridade é do fonoaudiólogo.

“Muitos pediatras, às vezes, falam para esperar um tempo, mas, na dúvida, não espere! Não tem que aguardar, não existe essa história de preguiça para falar. É fundamental procurar um profissional que saiba analisar cada caso porque as possíveis causas são muitas: a criança pode não ouvir bem, pode estar com alguma dificuldade ou pode não ser estimulada o suficiente. E, para essa faixa etária, quaisquer três meses já fazem muita diferença. Por isso, a recomendação é sempre procurar um fonoaudiólogo!”, salienta.

A professora também destaca que, às vezes, trata-se apenas de um atraso na fala, mas pode acontecer também desse ponto ser uma manifestação de um quadro maior. “Se a criança não responde aos estímulos; se não reage a um som alto, o que pode ser uma dificuldade auditiva; se não interage, não demonstra prazer ou intenção de se comunicar com o outro; se tem dificuldade no contato visual, o que pode ser sinal de risco para um transtorno do espectro autista ou outros transtornos do desenvolvimento; os cuidadores têm que consultar especialistas”, aponta Simone.

A procura da ajuda da fono é oportuna também para a indicação de profissionais de outras áreas que podem e devem ser consultados para que o melhor diagnóstico seja fechado. “Assim, a intervenção precoce sempre tem melhores resultados! Seja uma coisa mais simples ou mais complexa em termos de atraso de fala/linguagem/comunicação, quanto antes começar, os estudos mostram que os efeitos são melhores”, explica a professora da USP.

Atraso na fala de crianças: fonoaudióloga de Bauru explica quais são os sinais de alerta e quando procurar ajuda especializada
Foto: Reprodução/Freepik

Consequências da pandemia

Com o longo período de isolamento social, o afastamento das escolas e de diversos locais em decorrência da pandemia de coronavírus, muitas crianças em idade de desenvolvimento da comunicação, da linguagem e da fala foram privadas de momentos que seriam oportunidades de aprendizado.

A interação com o outro, seja criança ou adulto, é necessária, bem como a troca estabelecida em ambientes comunicativos variados que oferecem uma diversidade rica de estímulos. “Tudo isso teve um impacto, sim. Todos os fonoaudiólogos com os quais eu trabalho, e eu também, já sentimos um aumento da demanda desses casos. Mas é o que eu falei: antes, a gente tem que avaliar vários fatores. Não significa que essa criança não teria um atraso mesmo que não tivesse pandemia. A gente precisa fazer uma avaliação cuidadosa para iniciar uma intervenção precoce”, considera.

Pais, familiares e responsáveis

A fonoaudióloga de Bauru relata que, hoje em dia, existem vários perfis inseridos nesse contexto. “Os pais estão cada vez mais informados. Muitas vezes, chegam até um pouco desesperados ao consultório. Eles colocam, na clínica, ‘meu filho não fala”. E aí aparece um monte de sinais que podem ou ser indicativos. Sempre é bom buscar informação, mas de qualidade e especializada para não entrar nesse desespero”, analisa.

Por outro lado, Simone também diz perceber pais influenciados, muitas vezes, por informações errôneas, familiares, vizinhos, amigos e conhecidos que querem ajudar, mas, na verdade, não o fazem. “Falam assim: ‘espera mais um pouco, essa preocupação é coisa da sua cabeça’. Tem muitas mães, inclusive, que reclamam de terem as suas percepções não validadas porque as pessoas aconselham deixar o tempo passar. Por isso, repito: na dúvida, não espere!“, reforça.

A professora da USP afirma que devemos combater resistências na hora de procurar ajuda especializada com informação segura para que as pessoas tenham a real dimensão que a ausência ou da dificuldade da fala/linguagem/comunicação pode ter um impacto ao longo de toda a vida, do desempenho escolar até a aprendizagem. Para ela, esse eixo é um entre os itens que fazem parte do desenvolvimento de uma criança, porque ainda há os aspectos motores, sociais e o emocionais. “Então, muitas coisas devem ser pensadas. Tudo isso é muito sério e deve ser encarado com tal pelos pais e por todas as pessoas que atuam e trabalham com os pequenos”, alerta.

Sinais de alerta e de evolução

Simone explica que existem sinais em uma evolução típica.

  • A criança sempre adiciona novas palavras ao seu vocabulário e tenta falar com sons mais complexos;
  • O pequeno começa com palavras pequenas, depois vai de termos monossílabos para trissílabos;
  • Posteriormente, junta duas palavras para formar frases;
  • A evolução é percebida e acontece no dia a dia.

Sinais de alerta:

  • Não responder a estímulos;
  • Não reagir diante de sons altos;
  • Não demonstrar interesse nas relações;
  • Não interagir com os outros (adultos ou crianças);
  • Não demonstrar prazer ou intenção de se comunicar;
  • Ter dificuldade no contato visual.

Outro ponto destaca por Simone é parar de adquirir novas palavras ou perder aprendizados adquiridos. “Por exemplo, o pequeno falava determinadas palavrinhas e parou de falar, mostrava o que queria e parou de fazer isso. Qualquer coisa nesse sentido é um sinal de grande alerta!”, esclarece.

Dicas e recomendações

A fonoaudióloga e especialista em linguagem aponta:

  • A primeira atitude é procurar um profissional habilitado para receber um diagnóstico;
  • Priorizar uma intervenção precoce;
  • Em casa, os pais e cuidadores devem sempre conversar com as crianças, olhando nos olhos e abaixando até ficar face a face com o pequeno;
  • Os adultos devem ouvir mais, isso porque há a mania de falar muitas coisas para a criança (“faz isso” ou “come aquilo”), mas é importante a falar com a criança e tratá-la como uma interlocutora.
  • Crianças precisam brincar e manipular brinquedos;
  • A faixa etária de indivíduos de até dois anos e meio não deve ter tempo em tela (televisão, computador, celular, tablet e demais dispositivos)! E mesmo depois que esse contato tem início, são períodos que a Sociedade Brasileira de Pediatria indica que devem ser curtos;
  • A interação com os pais e familiares deve ser de qualidade: sentar para brincar, levar no parquinho, mostrar a vivência do dia a dia, aproveitar realmente todos os estímulos possíveis e incentivar a curiosidade.

Consultoria: Professora Doutora Simone Ap. Lopes-Herrera

Fonoaudióloga graduada pela Universidade de São Paulo (USP – Campus Bauru), Especialista em Linguagem pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFª), Mestre e Doutora em Educação e Ciências Humanas pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Possui Pós-Doutorado em Clínica Médica pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e é Professora Associada (Livre Docente em Linguagem Infantil e Fluência) do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade de São Paulo (USP – Campus Bauru). Empresária, Sócia-Proprietária e Coordenadora Científica e Pedagógica da Techknowledge Treinamentos, TK-EaD Cursos a Distância em Saúde e Educação.

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