Você já parou para pensar que aquela pessoa em situação de rua do seu bairro, ou que você vê diariamente no trajeto ao seu trabalho tem toda uma trajetória e motivos que a fizeram estar nessa situação? No Brasil temos uma população de moradores de rua estimada em mais de 222 mil pessoas segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), onde a maioria está localizada em grandes cidades do Sudeste, Nordeste e Sul do país.

Há um conjunto de fatores que levam geralmente essas pessoas às ruas, entre elas a crise econômica, desemprego, conflitos familiares, vícios, entre outros. E queremos contar um pouco para vocês hoje sobre o projeto Atibaia Invisível, que busca humanizar o olhar da população sobre as pessoas em situação de rua aqui na cidade. E para isso batemos um papo com o idealizador do projeto que contou para a gente como tudo começou. Confira!

Em números divulgados em 2019 pela Prefeitura Municipal, Atibaia contabiliza ao menos 58 pessoas vivendo em situação de rua. – Foto: divulgação

O que é o Atibaia Invisível

O projeto Atibaia Invisível nasceu em maio de 2019 e é inspirado na página SP Invisível, pioneira nesse tipo de conteúdo no país. No instagram do projeto são apresentadas semanalmente diversas histórias da vida de pessoas em situação de rua da cidade, dando voz e trazendo visibilidade a essa parcela da população, Mostrando assim um lado que muitos de nós não conhecemos sobre eles.

Aqui em Atibaia o projeto é administrado pelo atibaiense Paulo Teixeira, que sempre desejou ajudar de alguma forma essa população em situação de rua.

Comecei o projeto em Atibaia porque eu sempre tive vontade de ajudar às pessoas em situação de rua. Entender o motivo de elas estarem naquela situação e tentar ajudar e mudar aquele status de alguma forma.

Paulo já apresentou no instagram do projeto mais de 45 histórias, sempre pedindo autorização para gravar as conversas e tomando o cuidado de compartilhar as mesmas exatamente da maneira como foi contada a ele.

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A minha maior esperança? É de desempenhar o meu trabalho, graças a Deus, eu tenho! Tenho muita competência ainda. Você pode ver, eu já não ando mais cabeludo, desgastado, com a barba caída até aqui. Unha cortada, não tô mais unhudo. Se aparecer uma oportunidade, eu tô lá. Você fez uma pergunta bonita pra mim, viu! Reza por mim, que eu vou rezar por você tbm. Eu tenho esperança sim, o loco. Quem diria que há dois anos atrás eu tava pegando uma reforma de um advogado e eu terminei tudo, encanamento, piso, terminei banheiro, terminei cozinha, quarto. A parte da obra que eu mais gosto de fazer é acabamento, piso e azulejo. (Dá um tempo, Jonas, dá um tempo aí, tô dando uma entrevista pro meu amigo aqui, dá um tempo aí.) Mas o pessoal olha pra mim assim meio desgastado e acha que eu não sei fazer nada. Meu maior sonho? Essa resposta eu já tive já! Hoje é sábado? Essa resposta eu tive na quinta feira! De voltar trabalhar em obra de novo. Esse é o meu maior sonho! Você gravou a minha história aí? Quanta oportunidade de obra eu tive e desempenhei, ajudei minha família em tudo, por muitos anos. Mas eu esbanjei. Eu dormia aqui, naquela árvore ali, eu e Deus. Queria a oportunidade de voltar pra casa da minha irmã e dos meus irmãos. Aí eu estou realizado! Olha que palavra bonita, realizado! Sabe quantos anos de profissão? Comecei com 16, hoje tô com 61, de 16 pra 61, 44 anos. Era pra mim estar no auge da carreira. Depois vc faz uma pesquisa sobre 44 anos de profissão que só me deu alegria. Mas eu não soube cuidar. Mas nunca perdi a esperança! Eu poderia estar aposentado, de boa, tranquilo. Minha história é muito longa né? De 44 anos de profissão, muito pesado né? Índio é apelido meu, meu nome é José Luís dos Santos. Minha história é muito longa, mas dá pra você ter uma noção. . . Dia 13 de julho nossos kits vão estar na rua e você pode fazer parte disso. Doe e nos ajude a concluir a meta de montar 60 kits de frio. www.catarse.me/atbinvisivel (link na descrição) #atbsemfrio #atbinvisivel #Desapega #doe #atb

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Dois nomes bíblicos. Ezequiel Marcos do Nascimento. Faz 50 anos que eu moro aqui, eu tô com 55. Infelizmente eu moro na rua. Eu comecei a ficar na rua quando meu pai faleceu. Meu pai foi o último a falecer, em 2000. Faz 19 anos que eu tô na rua, mas não dá pra ficar em albergue. Eu tenho 4 coberta, então dá pra passar frio não. Quando tô no sol, meu olho fica esverdeado, e quando ta na sombra ele fica verde escuro. Eu sempre trabalhei com obra, mas eu tive um AVC, né, já faz 6 anos já. Tô tentando minha aposentadoria, mas não tô conseguindo não. Agora vou ser obrigado a pagar um advogado. Já foi 3 carta pra Brasília e até agora nada, então, pagando um advogado tem que sair. Nem que eu dê um mês pra ele, faz 6 anos que eu tô esperando essa aposentadoria. Ai se eu conseguir a aposentadoria, aí eu alugo uma casa, compro minhas coisinhas devagar, aí cê pode até arrumar uma fulana. Eu tenho uma filha, ela fez 20 anos agora em dezembro, mas ela mora lá em Bom Repouso. Ela me disse: “pai, para de beber, a mãe falou que volta com você.” Agora, voltar como? Não posso trabalhar nada. Eu recebo o bolsa família, 91 real. Num é muito, mas né. Dá pra você se virar. Graças a Deus a mãe dela nunca pediu pra mim pagar pensão. Se eu morasse com ela, eu cuidava dela, tudo. Ela quer se formar pra médica. Se eu conseguir aposentadoria, com certeza eu vou mandar um dinheiro pra ela, vou pegar o número da conta dela, ai eu ajudo ela, mas tem que depender da minha aposentadoria. Como eu vou ajudar? Não tenho nem onde cair morto. De noite eu to dormindo na ração, do lado de baixo da escola, durmo sempre ali. tem um colega que todo dia me da 2 real, pra tomar um café. Mas ele não sabe da última. Comprei um corotinho pra ficar sossegado o dia inteiro. É o que me mantém aquecido, ainda mais agora né. É uma gratidão pois ele tá sabendo que eu durmo na frente da firma dele. Se chegar alguém fazendo bagunça lá, eu tesouro. Catei tudo o lixo que tava jogado no chão lá. Até estranho, ontem tinha um saco preto lá, acho que é o vizinho que joga na rua, o meu é o saco branco. Coisa pra frente todo mundo quer. Quem não quer?… [Continua nos comentários]

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A Casa Invisível

O propósito principal do projeto em um futuro não muito distante é criar em Atibaia a “Casa Invisível”, um local que servirá de lar e apoio para as pessoas em situação de rua que desejarem ser reinseridas na sociedade. A casa objetivará também estabelecer parcerias com escolas de cursos profissionalizantes, faculdades e empresas privadas. Visando assim oferecer um curso rápido ou formação completa para os seus moradores e após essa formação, oferecer uma vaga junto a empresa parceira.

A ideia da casa, é que a pessoa fique lá durante 6 meses, aprenda uma profissão e se engaje na nova empresa. Ganhando assim um salário e podendo pagar seu próprio aluguel, se reinserindo na sociedade.

Imagem: reprodução

Como Ajudar

Além das postagens das histórias nas redes sociais os organizadores do projeto entregam semanalmente kits de higiene e de alimentação para as pessoas em situação de rua na cidade. Paulo conta que também ajuda algumas famílias carentes com mantimentos, pois muitas delas mesmo morando em casas, vivem em situação de rua. É o caso da história da Maria e sua família, que foi apresentada recentemente no Instagram do projeto, confira:

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Olha aqui, não tem o que fazer, o negócio tá ruim, não tem como ficar do jeito que tá e meu benefício tá em análise ainda. (Frase da Maria, nos mostrando o armário da casa dela vazio) Aí, a gente coloca as coisas tudo pra vender, vendi o celular já. Tô vendendo as coisas porque eu pago aluguel aqui. E a gnt sabe o que estamos passando, mas ela não quer saber, ela quer receber. São 400 reais de aluguel. Só que eu vou vender mais o que? Olha aí. Eu já coloquei tudo na feira do rolo, e eu vendo não é nem o preço. Aí eu coloquei no face que queria faxina em troca de cesta básica. Aqui tem muita chácara pra fazer limpeza, mas é de idoso, aí eles não chamam por medo, né. Essa aqui é minha irmã, ela veio da Bahia porque mataram o filho dela há 3 meses. O filho dela morava a comigo, aí ele foi cobrar o patrão que não pagou ele, aí o patrão foi e matou ele, ele tinha 25 anos. Ela veio pra resolver isso, mas como deu o coronavírus os ônibus não tão indo e ela ficou presa com os 2 filhos e o neto. Ela fica triste pq ela veio só com o dinheiro da passagem, cada uma é 600 reais, e ela nem consegue me ajudar. Eu ia colocar o celular da minha filha pra vender, mas é judiação né. Da dó e é o único celular da casa. Eu cheguei a ir pra Bahia, mas a situação lá é pior que aqui. Voltei e comecei a trabalhar na Atigel, aí minha hérnia estourou e eu fiquei um tempo afastada e quando voltei trabalhar me mandaram embora, nem falaram nada. Eu trabalhava no restaurante, mas com esse negócio aí me mandaram embora. Eu tive que dar meu filho pro pai, porque, a gente ainda aguenta né, mas ele… Eu tive que dar ele pro pai por causa da situação. Me dói, mas é o melhor pra ele. E hoje é o aniversário dele. Me dói porque ele não tá comigo. Foi o que eu coloquei no face, eu disse que troco, faço faxina por alimento. Semana passada eu fui 2 dias com a minha filha carpir um quintal por 100 reais. Era o que tinha, comprei uma coisa e outra e ajudou. Se a gente não fizer isso, ficar esperando cair as coisas do céu a gente morre. Eu limpo, faço faxina, vou carpir, lavo roupa e já ajuda. Se eu me desesperar é pior. Continua nos comentários…

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Caso você também deseje contribuir com o projeto basta clicar AQUI. Além de dinheiro para a compra e montagem dos kits você também pode ajudar com mantimentos, roupas e itens de higiene pessoal. Todo o valor arrecadado é revertido em itens necessários para as ações do projeto.


Gostou desse conteúdo? Deixe seu comentário no campo abaixo! E se você conhece alguma história bacana da sua cidade e quer que ela seja contada aqui, entre em contato pelo e-mail: [email protected]

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